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5 de fevereiro de 2012

Corpus Hermeticum - A Chave (de Hermes Trimegistro)


1 - Foi a ti ó Asclépios, que dediquei o discurso de ontem. O de hoje, deve ser por justiça, dedicado a Tat, pois este discurso é apenas um resumo das Lições Gerais que desenvolvi para ele. Deus todavia, o Pai, ó Tat, tem a mesma natureza; ou melhor, a mesma atividade que o Bem. Pois o termo natureza se aplica ao fato de impelir a crescer, o que se verifica apenas nas coisas mutáveis e móveis, enquanto que o termo atividade alcança as coisas imóveis também, isto é, alcança as coisas divinas e humanas, e por si mesmo transforma a energia, como mostramos anteriormente relativamente às coisas divinas e humanas, ensinamentos que ser-te-ão necessários manter na mente quanto a este assunto.


2 - Ora, a atividade de Deus, é sua vontade e sua essência é de querer a existência das coisas. Que é efetivamente Deus, o Pai, o Bem, senão o ser das coisas, ainda que atualmente não sejam, como digo, a própria realidade de tudo o que é? Eis o que é Deus, eis o que é o Pai, eis o que é o Bem, ao qual não se dá nenhuma outra qualificação. Pois se o mundo, tanto quanto o Sol, é pai dos seres que são por participação, todavia não é para os viventes, na mesma medida que Deus, a causa do Bem, e não mais ainda, da vida, e se for a sua causa, é unicamente sob coerção do bem-querer, sem o qual nada pode existir nem vir a Ser.

3 - O pai só é o autor da geração e da subsistência de seus filhos, enquanto recebe a compulsão do bem pelo canal do sol. Pois é o Bem que é o princípio eficiente: esta qualidade não pode aparecer em nenhum outro que não ele mesmo, que jamais recebe coisas, mas que quer a existência das coisas. Eu não direi, ó Tat, "quem faz os seres", pois aquele que faz pode ser deficiente durante longos intervalos enquanto faz e não faz; pode ser deficiente relativamente à qualidade e à quantidade, pois faz tais qualidades e tais quantidades e ao mesmo tempo seus contrários. Mas Deus é o Pai e o Bem naquilo em que as coisas existem.

4 - Assim é quanto cabe aquele que pode "ver". Pois disso também, Deus, quer a existência, e disso mesmo sobretudo é que é a causa. Verdadeiramente, todo o resto existe só para isso: pois a marca própria do Bem, é que o Bem seja conhecido, ó Tat.
- Tornaste-nos repletos, ó pai, da boa e completamente bela visão, e pouco é preciso para que o olho de meu intelecto renda homenagem sob a influência de uma tal visão. - Sem dúvida, pois não é da visão do Bem como do raio soltar, que pela sua natureza ígnea deslumbra os olhos pela sua luz, e os força a se fechar; contrariamente esta visão ilumina, e isso tanto mais quanto mais se é capaz de receber o influxo do esplendor inteligível. Mais agudo que o raio solar para nos penetrar, é por outro lado, inofensiva e repleta de toda imortalidade, tão bem que aqueles que aí podem se abeberar desta visão freqüentemente caindo no sonho e se destacando do corpo, chegam à visão mais bela tal como ocorreu a Uranus e Cronos, nossos ancestrais. - Possa-nos também assim suceder, ó meu pai! - Apraz a Deus, meu filho. Mas agora, ainda somos muito fracos para chegar a essa visão; ainda não temos força suficiente para abrir os olhos de nosso intelecto e contemplar a beleza daquele Bem, sua beleza imperecível, incompreensível. Quando nada mais puderes dizer, é somente então que vê-la-ás. Pois o conhecimento que se toma é silêncio divino, inibição de nossos sentidos.

6 E aquele que a percebeu uma vez não pode perceber nenhuma outra, o que a contemplou uma vez nenhuma outra pode contemplar e não pode ouvir falar de nada além e, em suma, não pode mesmo mover o corpo: pois, perdendo a consciência de toda sensação, de todo movimento corporal, permanece em repouso; e esta beleza tendo banhado com sua luz todo intelecto, é a alma toda que também ilumina e que atrai através do corpo, assim transformando o ser humano inteiro na Essência. Pois é impossível, meu filho, que a alma que contemplou a beleza do Bem seja divinizada enquanto permanecer num corpo humano.
Que queres dizer por "ser divinizada", ó pai? - Toda alma separada, meu filho, sofre metamorfoses. - Mas então, que queres dizer por "separada"? - "Não escutaste nas Lições Gerais que é de uma só Alma, a Alma do Todo, que surgiram todas essas almas que turbilhonam no mundo como distribuídas em suas partes? Dessas almas então, numerosas são as metamorfoses de uma para uma sorte mais feliz, de outras para uma sorte contrária: pois as almas inferiores passam para animais aquáticos, as almas aquáticas em animais terrestres, as almas terrestres em voláteis, as almas aéreas em homens, enfim as almas humanas fázem sua entrada na imortalidade transformando-se em `daimons', e depois neste estado passando no coração dos deuses (há dois corações de deuses - o dos astros errantes e dos fixos).

8 E tal é a glória mais perfeitá da alma. Todavia, a alma que entra num corpo humano e permanece no vício, não experimenta a imortalidade, não toma parte no Bem, mas levada para trás percorre inversamente a rota seguida, e que conduz até aos répteis: tal é a sentença de condenação da alma viciosa.
Ora, o vício da alma é a ignorância. Realmente quando uma alma não adquiriu nenhum conhecimento dos seres, nem de sua natureza, nem do Bem, quando é cega, sofre os embates violentos das paixões corporais. Então a infeliz, para ignorar-se a si mesma, torna-se escrava de corpo monstruoso e perverso, carrega seu corpo como um fardo, não comanda, sendo comandada. Tal é o vício da alma.

9 Ao contrário, a virtude da alma é o conhecimento: pois aquele que conhece é bom e piedoso, já divino. - Que espécie de ser humano é essa, ó pai? - É o ser humano que fala pouco a pouco escuta. Pois aquele que perde seu tempo a disputar e a ouvir as nov s golpeia o ar, filho. De fato, Deus, o Pai e o Bem, não se deixa ensinar pela palavra nem aprender pela audição. Nestas condições, se todos os seres possuem os órgãos dos sentidos por não poderem viver sem eles, o conhecimento difere muitíssimo da sensação. A sensação só se produz na dependência do objeto que nos impressiona, ao passo que o conhecimento é a perfeição da ciência, que por si só é um dom de Deus. 

10 Pois toda ciência é incorpórea, -- então o instrumento do qual ela se serve é o próprio intelecto que, e seu turno se serve do corpo. Ambos os objetos inteligíveis e os materiais entram no corpo. Pois tudo deve resultar da oposição e da contrariedade; é impossível ser de outra forma.
- Qual é então esse deus material? - É o mundo, que é belo, mas que não é bom. É feito de matéria e é facilmente afetado; o primeiro dentre todos os passivos, é só o segundo na série dos seres sendo isoladamente incompleto; tendo ele mesmo começado a ser, não obstante subsistindo sempre, subsiste no devir; e assim sempre no devir, o é das qualidades e das quantidades: pois é movimento e todo movimento da matéria é o vir a ser.

11 A imobilidade inteligível detém o movimento da matéria da seguinte maneira. Sendo o mundo uma esfera, quer dizer, uma cabeça, e como acima da cabeça nada há de material assim como sob os pés nada há de inteligivel sendo tudo material, e como o intelecto é a cabeça, cabeça movida por um movimento circular, ou seja do movimento próprio à cabeça - as coisas que então ligadas à membrana dessa cabeça onde se acha a alma são por natureza imortais: e como o corpo foi feito por assim dizer na alma, elas têm também mais alma do que corpo-Tudo o que está distanciado da membrana é mortal, por ter mais corpo do que alma. Assim todó o vivente como o próprio universo é composto de material e de inteligível.
O mundo é então o primeiro. Quanto ao homem, segundo vivente depois do mundo, mas o primeiro dos mortais, possui em comum com os outros viventes o princípio de animação; por outro lado não é simplesmente não-bom, mas, mau enquanto mortal. O mundo é não-bom pois é móvel, mas é não-mau enquanto imortal. O homem, contrariamente, é duplamente malvado, pois é móvel e mortal. A alma do ser humano é veiculada da seguinte maneira. O intelecto está contido na razão discursiva (logos), a razão (logos) na alma, a alma no sopro: enfim o sopro passando através das veias, das artérias e do sangue coloca em movimento o vivente e pode-se dizer, até certo ponto, que o porta.
Esta é a razão de alguns pensarem que a alma é o sangue, mas enganam-se quanto à sua natureza: não sabem que é preciso que o sopro tenha se retirado e permanecido na alma, depois que o sangue tenha se coagulado e que então, as veias e as artérias tendo se esvaziado, façam perecer o vivente. Nisto consiste a morte do corpo.
Todo o universo depende de um único Princípio, e esse Princípio depende do UM-Único. O Princípio está em movimento a fim de tornar-se princípio, enquanto que o Um, somente, permanece imóvel e estável. Existem então estes três seres, Deus, o Pai e o Bem, o mundo e o ser humano. O mundo está contido em Deus, o ser humano no mundo. O mundo é filho de Deus e o ser humano filho do mundo, por assim dizer: neto de Deus.
Deus não ignora o homem, pelo contrário conhece-o bem e quer por este ser conhecido. Somente isto é salutar para o ser humano, o conhecimento de Deus. Esta é a via para o Olimpo. Somente por ele a alma torna-se boa. Mas não permanece boa para sempre, torna-se má: necessariamente. - Como dizes, ó Trismegistos? - Considera a alma de uma criança, meu filho: enquanto ela não foi separada de seu verdadeiro ser e que o corpo ao qual pertence tem apenas um pequeno volume, não atingiu seu pleno desenvolvimento, como é bela então, nesta hora em que não foi tocada pelas paixões do corpo e que está ainda quase presa à Alma do Mundo! Mas quando o corpo atingiu o seu volume e atirou, arrastou a alma para baixo rumo ao peso corporal, a alma tendo sido separada de seu verdadeiro ser, gera o esquecimento: nada mais tem a haver com o belo-e-bom e é o esquecimento que a torna má.
A mesma coisa acontece àqueles que saem do corpo. A alma tendo retornado a seu verdadeiro ser, o sopro se contrai no sangue, a alma no sopro e o intelecto após ter se purificado de seus envoltórios, pois é divino por natureza, e após ter recebido um corpo de fogo (de daimon), percorre, todo o espaço, abandonando a alma ao julgamento e veredito que merece. - Como dizes, ó pai? Pretendes que o intelecto se separe da alma e a alma do sopro, quando dizes que a alma é o envoltório do intelecto e o sopro o envoltório da alma?
Aquele que escuta, meu filho, deve manter uma mesma inteligência e sopro que aquele que fala, deve ter um ouvido mais pronto do que a voz daquele que fala. A conjunção desses envoltórios, minha criança, produz-se num corpo de terra. Pois é impossível para o intelecto instalar-se nu, como é na sua essência, em um corpo de terra: pois nem o corpo de terra é capaz de portar uma imortalidade tão grande, nem uma virtude tão possante permitir que se lhe prenda, pouco a pouco, um corpo passivo. O intelecto tomou então a alma como envoltório, e a alma que também é de algum modo divina, utilizou por sua vez o sopro como servidor, enquanto que o sopro governa o vivente. Quando o intelecto se separa do corpo de terra, reveste-se rapidamente da túnica que lhe é própria, a túnica de fogo, que não pode usar quando veio se estabelecer no corpo terrestre (pois a terra não pode conter o fogo: basta uma pequena faísca para fazê-la arder e eis porque a água se expande em torno da terra, como barreira e muro de defesa contra o fogo flamígero.). O intelecto então sendo o mais penetrante dos conceitos divinos, possui como corpo o mais penetrante de todos os elementos, o fogo. E como o intelecto é o fautor de todos os seres, é o fogo que toma como instrumento para esta fabricação. O intelecto do Todo é o fautor de todos os seres, o intelecto do ser humano faz, tão-somente, os da terra. Pois, desprovido de sua 'vestimenta ignea, o intelecto que habita nos homens é incapaz de perfazer os seres divinos pois sua habitação lhe impõe a condição humana. Quanto à alma humana, não toda alma para dizer a verdade, mas a piedosa, é de alguma forma daimoníaca (de daimon) e divina. Essa alma, então quando se separa do corpo após ter percorrido o curso da piedade (N.T. - esse curso consiste em conhecer o divino e não fazer mal a nenhum dos seres humanos), torna-se totalmente intelecto. Contrariamente a alma ímpia permanece no nível de sua própria natureza, torturando a si própria e procurando um novo corpo de terra no qual possa penetrar, mas um corpo humano: pois nenhum outro corpo saberia conter uma alma humana e a ordem divina interdita à alma humana o cair num corpo de animal sem razão. É com efeito uma lei de Deus que a alma humana seja protegida de um tão grande ultraje.
Mas então, ó pai, como a alma humana é punida? - Existe maior tortura para a alma humana, criança, que a impiedade? Que fogo tem uma chama tão grande quanto a impiedade? Que besta é tão devoradora, para mutilar um corpo, tanto quanto a impiedade mutila a alma? Não percebes os suplícios de uma alma ímpia que grita por socorro; e se lamenta: "Eu queimo, estou em chamas: que dizer, que fazer, eu não sei. Sou devorada, infeliz, pelos males que me possuem. Não vejo mais, nem ouço." Não são estes os gritos de uma alma que se pune? Ou vais, minha criança, segundo a opinião vulgar, acreditar, que a alma ao sair do corpo é transformada em besta, o que é um sério engano?
21 Eis com efeito qual é o castigo da alma. É ordem estabelecida que o intelecto assim que se torne daimon, receba um corpo de fogo para ser colocado ao serviço de Deus que sendo introduzido numa alma muito ímpia, flagela-a com os açoites reservados aos pecadores, sob os golpes dos quais a alma ímpia precipita-se nos assassinos, ultrajes, calúnias e violência de toda sorte, instrumentos das injustiças humanas. Quando, contrariamente, o intelecto ingressa numa alma piedosa, guia-a para a luz do conhecimento e a alma assim favorecida nunca deixa de cantar a Deus e de estender suas bênçãos para todos os homens por benefícios em palavras e obras, à imitação de seu pai.
22 Também, ó criança, quando rendes graças a Deus, deves pedir a obtenção de um bom `intelecto'. A alma também pode passar a um corpo superior, mas é impossível que passe a um corpo inferior. Existe uma comunhão entre as almas: as almas dos deuses entram em comunhão com as dos homens, as almas dos homens com as dos seres sem razão. - Os seres superiores cuidam dos seres inferiores, os deuses dos seres humanos, os seres humanos dos animais sem razão, Deus de todos: pois é superior a todos e todos lhe são inferiores. O mundo é submisso a Deus, o ser humano ao mundo, os seres sem razão ao homem; Deus, está acima de todos os seres a vela por todos. As energias são como os raios de Deus, as forças da natureza como raios do mundo, as artes e as ciências como os raios do homem. As energias agem através do mundo e atingem o ser humano pelo canal dos raios físicos do mundo; as forças da natureza agem por meio dos elementos e os homens por intermédio das artes e das ciências.
23 E tal é o governo do Todo, governo dependente da natureza do Um e que penetra por toda parte por intermédio único do intelecto. Nada há de mais divino e mais ativo que o intelecto, nada de mais apto para unir os homens aos deuses e os deuses aos homens. O intelecto é o Bom Daimon.
Feliz a alma que está plena deste intelecto, infortunada e que está totalmente desprovida dele.
- Que queres dizer com isto, ó pai? - Crês, minha criança, que toda a alma possui intelecto, quero dizer, o bom? Pois é deste que falamos e não o intelecto servidor, do qual falamos mais acima, que é enviado para cá pela Justiça.
Sem intelecto, realmente, a alma "não pode nada dizer nem nada fazer." Freqüentemente, na verdade, acontece que o intelecto se afasta da alma e, nestas horas, a alma não vê, nem escuta, mas assemelha-se a um animal, tão grande é a potência do intelecto! Por outro lado o intelecto não pode suportar uma alma torpe, mas abandona esta alma presa ao corpo e sufocada por ele cá embaixo. Essa alma, meu filho, não possui intelecto nem se deve chamar de "ser humano" um tal ser. Pois o ser humano é um vivente divino, que não deve ser comparado ao resto dos viventes mortais, mas àqueles do alto, no céu, que se chamam deuses. Ou melhor, é preciso ousar dizer a verdade, é ainda acima desses deuses que está estabelecido o ser humano realmente humano ou, pelo menos, existe completa igualdade de poder entre uns outros.
25 Realmente nenhum dos deuses celestes deixará a fronteira do céu e descerá sobre a terra, o ser humano contrariamente se eleva até ao céu e o mede, e sabe o que está em cima no céu, o que está embaixo, e aprende todo o resto com exatidão e, maravilha suprema, não precisa deixar a terra para se estabelecer no alto, tão longe se estende seu poder! É preciso então ousar dize-lo, o ser humano terrestre é um deus mortal, o deus celeste um ser humano imortal. É também por intermédio dessa dupla, o mundo e o ser humano que as coisas existem, mas foram produzidas pelo Um.



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Corpus Hermeticum - De Noús a Hermes


Retenha bem meu discurso, Hermes Trismegistos, e mantenha na memória o que te digo. Quanto a mim, não hesitarei a declarar o que me vai no espírito. - Falou-se bem e muito relativamente ao Todo, a Deus e estes assuntos são contraditórios, tanto que não consegui, no que me concerne, apreender a verdade: esclareça-me sobre o assunto, Senhor. Pois é a ti e a ti somente que me será possível crer, se desejas desvelar-me a questão.

Escuta então, o que concerne a Deus e ao Todo.

Deus, a eternidade, o mundo, o tempo, o futuro.

Deus fez a Eternidade, a Eternidade fez o mundo, o mundo fez o tempo, o tempo fez o futuro. De Deus, a essência por assim dizer é (o bem, o belo, a beatitude) a sabedoria; da eternidade é a identidade; do mundo é a boa ordem; do tempo é a mudança; do futuro é a vida e a morte. Deus tem por energia o intelecto e a alma; a Eternidade a duração e a imortalidade; o mundo o apocatastasis e o apocatastásis oposto; o tempo o crescimento e o decrescimento; o futuro e qualidade e a quantidade. Assim a Eternidade está em Deus; o mundo na Eternidade, o tempo no mundo, o futuro no tempo. E enquanto a Eternidade se mantém imóvel em Deus, o mundo está em movimento na Eternidade o tempo se cumpre no mundo e o futuro se desenrola no tempo

3 Deus é portanto a fonte das coisas, a Eternidade lhes é essência e o mundo a matéria. A Eternidade é a Potência de Deus, e a obra da Eternidade é o mundo, que não tem começo, mas que é continuamente no futuro pela ação da Eternidade. Eis porque tudo o que está nesse mundo não perecerá jamais (pois a Eternidade é imperecívell nem será destruído, porque o mundo está totalmente envolvido pela Eternidade. - Mas o que é a Sabedoria de Deus? - É o bem e o belo e a beatitude e a virtude total da Eternidade. A Eternidade faz do mundo uma ordem, introduzindo a imortalidade e a duração na matéria.

4 Com efeito, o devir da matéria depende da Eternidade, como a Eternidade depende de Deus. O devir e o tempo se encontram no céu e na terra, mas possuem duas naturezas diferentes: no céu não se transformam e são imperecíveis, na terra são mutáveis e perecíveis. E da Eternidade Deus é a alma, do mundo é a Eternidade, da terra é o céu. Deus está no intelecto, o intelecto na alma, a alma na matéria: e todas essas coisas subsistem, através da Eternidade. Todo esse grande corpo no qual se acham contidos os corpos, uma alma plena de intelecto e de Deus o completa no interior e o envolve no exterior, vivificando o Todo no exterior desse vasto e perfeito vivente que é o mundo, no interior de todos os viventes e no alto, no céu dura sem mudar, idêntica a si mesma, embora embaixo, na terra, produza as variações do devir.

5 É a Eternidade que mantém coeso todo esse mundo, por meio da necessidade, ou da providência, ou da natureza, ou de seja lá o que for que se possa pensar hoje ou depois. E tudo que produz pela sua atividade, é Deus, e a energia de Deus, força insuperável, e à qual não se podem comparar as coisas humanas ou divinas. Por esta razão, ó Hermes, nunca vá pensar que alguma das coisas daqui de baixo ou de cima são semelhantes a Deus, pois te afastarás da verdade: efetivamente nada há de semelhante ao Dissemelhante, Só e único. E não pense também que ele dá parte de sua potência seja lá a quem for. Existe depois dele algum outro criador da vida, da imortalidade, da transformação? E ele que poderá fazer além de criar? Pois Deus não é inativo, de outra forma o Universo também seria inativo: pois tudo é pleno de Deus. Mas, de fato, não se verifica inatividade em parte alguma, nem no mundo, nem em qualquer outro ser que seja. Inatividade é uma palavra vazia, relativamente àquele que criou e àquele que vem a ser.

6 Ora é necessário que tudo venha a ser, e sempre, segundo a influência própria a cada lugar. Pois aquele que cria está em todos os seres, não permanece fixado em um deles e não criou um apenas, mas todos: pois sendo uma força sempre atuante não tira sua suficiência dos seres criados mas são os seres criados que lhe são submissos.
Contempla, por mim o mundo que se oferece à tua visão e considera atentamente sua bondade: esse corpo sem mácula que nada ultrapassa em antigüidade, eternamente na força da idade e jovem, e sempre mais florescente!

7 Vê também a hierarquia dos sete céus formados em boa ordem segundo uma disposição eterna, preenchendo cada um por um curso diferente a eternidade. Vê todas as coisas repletas de luz sem que haja fogo em parte alguma: pois a amizade e combinação dos contrários e dos dissemelhantes tornou-se luz, repleta embaixo pela energia do deus que é gerador de todo bem, chefe e condutor de toda a boa ordem dos sete céus. Veja a lua que corre à frente de todos esses céus, instrumento da vida física, transformando a matéria daqui de baixo. Veja a terra, estabelecida no meio do Todo, bem estabelecida como fundamento deste mundo tão belo, nutriz dos seres terrestres. Considera ainda quão grande é a multiplicidade dos viventes imortais, imensa aquela dos mortais e veja, mediatriz entre mortais e imortais, a lua que prossegue sua ronda.

8 Tudo está cheio de alma, todos os seres estão em movimento, uns no céu, outros na terra e nem os que devem estar à esquerda seguem à direita e nem aqueles que devem estar à direita seguem à esquerda, nem os que devem estar no alto estão embaixo, nem os que devem estar embaixo estão no alto. Que todos esses seres foram produzidos, caríssimo Hermes, não precisas ouvir de minha boca: esses são com efeito os corpos, possuem uma alma, e são movidos. Ora todos esses corpos não podem convergir para um único ser sem alguém que os reúna. É preciso portanto que esse alguém exista e seja absolutamente único.

9 Pois, como os movimentos são diversos e múltiplos e como os corpos são dissemelhantes, como, portanto, a velocidade total imposta a esses corpos é única, não podem existir dois ou mais criadores: realmente, quando se é múltiplo não se mantém a unidade da ordem e não se pode ser múltiplo sem que resulte ciúme relativamente ao mais possante. E eu te direi, suponha que haja um segundo criador para os viventes mutáveis e mortais, seria tomado então do desejo de criar também os imortais e da mesma forma o criador dos imortais quereria criar os mortais. E mais ainda, suponha que existam dois enquanto que a matéria é uma e a alma uma, a qual dos dois pertencerá o cuidado de efetuar a criação? E se o cuidado pertence a ambos, qual dos dois tomará maior parte nele?

10 Pensa que todo corpo vivente é composto de matéria e de alma, tanto o imortal quanto o mortal, tanto o racional quanto o irracional. Pois todos os corpos viventes são animados e os não viventes são simplesmente a matéria que subsiste à parte nela mesma, deposta que está entre as mãos do criador e é então o criador dos imortais que é o autor da vida: como não criaria também os outros viventes que não imortais?

11 Que existe alguém que criou estas coisas é evidente. E agora está absolutamente manifesta a sua unicidade: na verdade a alma é uma, a vida é uma, a matéria é uma. Qual é então esse criador? Quem pode ser ele senão o único Deus? A quem seria conveniente criar viventes providos de alma, se não a Deus somente? Deus é portanto único. É coisa evidentemente visível! Reconheceste que o mundo é sempre um, o sol um, a lua uma, a atividade divina uma, e queres que Deus seja membro de uma série?

12 É Deus, portanto, que sozinho criou as coisas. E o que há de maravilhoso no fato de Deus ter criado ao mesmo tempo: a vida, a imortalidade, as transformações, se fazes, também, tantas coisas diversas? Pois vês, falas, escutas, cheiras, tocas, andas, pensas, respiras, e não é um outro que fala, que escuta, um outro que cheira, um outro que anda, um outro que pensa e um outro que respira, mas é um único ser que faz tudo isto. E as atividades divinas também não podem ser separadas de Deus. Pois se paras de fazer estes atos, não és mais um vivente e o mesmo se dá com Deus, pois se cessa de o fazer, coisa ímpia de se dizer, não é mais Deus.

13 Pois se demonstraste que não podes existir sem alguma atividade, quanto mais Deus! Com efeito, se existe alguma coisa que não crie, Deus, coisa ímpia de se dizer, é imperfeito; e se Deus não é inativo, mas contrariamente perfeito, é porque criou todas as coisas.
Se quiseres, ó Hermes, prestar-me um pouco de atenção, conceberás que Deus possui apenas uma obra, é fazer com que as coisas venham a ser, o que vem, o que veio há um momento, o que virá no futuro. É isto, caríssimo, que é a vida, que é o belo, que é o bem, é isto que é Deus.

14 E se quiseres compreendê-lo pela tua própria experiência, percebe o que se passa em ti quando queres engendrar. Verdadeiramente quando se trata de Deus, o ato de engendrar não é nem um pouco semelhante: Deus seguramente não encontra prazer sensível e não possui nenhum colaborador. Com efeito, como opera sozinho, sempre é imanente à sua obra, sendo ele mesmo o que ele produz. Pois se suas criaturas fossem separadas dele, dobrar-se-iam e pereceriam necessariamente, não mais possuindo vida. Mas, como tudo é vivente e como a vida também é uma, Deus é certamente único. Por outro lado, já que tudo é vivo, os seres do céu e os da terra, e como a vida é única em todos, é produzida por Deus e é ela que é Deus, é portanto pela ação de Deus que todas as coisas vêm a ser e a vida é a união do intelecto e da alma. Quanto à morte, ela não é a destruição dos elementos reunidos, mas ruptura da união.

15 Assim como a Eternidade é a imagem de Deus, o mundo imagem da Eternidade, o Sol imagem do mundo, o ser humano é a imagem do Sol. Quanto à transformação, é chamada morte porque o corpo se dissolve enquanto a vida se dissipa no invisível. Ora os seres que se dissolvem desta maneira, meu caríssimo Hermes, e o mundo, declaro que se transformam pelo fato de que, a cada dia, uma parte do mundo vai para o invisível, mas não que se dissolvam. E eis o que são as paixões do mundo: rotações e desaparições. Ora a rotação é revolução, e desaparição é renovação.

16 Destarte o mundo é omniforme, não que possua as formas abrigadas em si, é em si mesmo que ele se transforma. E sendo então o mundo omniforme, o que pode ser aquele que o criou? Não digamos que seja sem forma! Por outro lado, se também é omniforme, é semelhante ao mundo. Mas e se ele possui apenas uma forma? Será sob este ponto de vista inferior ao mundo. Que diremos que ele é para não deixar o discurso sem término? Pois nada é inconcluso na nossa concepção de Deus. Deus possui apenas uma figura - se alguma figura é própria a Deus - que não se oferece aos olhos corporais - incorpórea, e desvela todas as formas por meio do corpo.

17 E não te espantes que possa existir uma figura incorpórea, ela existe efetivamente, como a figura da palavra. E da mesma forma, nas pinturas, vêem-se cimos de montanhas se elevando muito acima, quando na verdade são chatas e lisas. Examina ainda o que acabo de te dizer de um ponto de vista mais ousado, mas também mais verdadeiro. Da mesma forma que o ser humano não pode existir sem a vida, Deus também não o pode sem produzir o bem. É isto precisamente que é a vida e movimento de Deus, o fato de mover todos os seres e de lhes dar a vida.

18 Certos termos devem ser tomados em uma acepção particular, considera por exemplo o seguinte argumento. Todos os seres estão em Deus, mas não estão colocados como em um lugar, (na verdade o lugar é um corpo, e um corpo imóvel, e o que está no lugar não possui movimento): mas é de uma outra maneira que estão colocados na faculdade incorpórea de representação. Concebe então aquele que contém todos os seres e compreende que não há nada que possa circunscrever o incorpóreo, nem que seja mais rápido e possante que ele, de fato é o incorpóreo que é incircunscritível, mais rápido e possante que todos os seres.

19 Julga-o também da maneira seguinte, segundo os teus critérios. Ordena à tua alma que esteja na Índia e eis que, mais rápida que tua ordem lá estará, não por ter viajado de um local e outro, mas como se já estivesse lá. Ordena que voe para o céu, e não necessitará a mesma de asas: nada pode impedí-la, nem o fogo do sol, nem o éter, nem a revolução do céu, nem os corpos dos outros astros: mas, cortando todos os espaços, subirá em seu vôo até ao último dos corpos.
E se quiseres passar a abóbada do universo e contemplar o que existe além dela (se é que algo existe depois dela): tu o podes.

20 Vês que potência, que velocidade possuis! E se podes tudo isto, Deus não o poderia? É desta maneira então que deves conceber Deus: tudo que é contido nele como pensamentos, o mundo, ele mesmo, o Todo. Se não te fazes igual a Deus, não podes compreender a Deus: pois o semelhante só é inteligível ao semelhante. Faça-te crescer até corresponder à grandeza sem medida, por um salto que te libere de todo corpo; eleva-te acima de todo tempo, torna-te o Aíòn: então compreenderás Deus. Sabendo que não é impossível para ti, estima-o imortal e capaz de tudo compreender, toda arte, toda ciência, o caráter de todo ser vivente. Sobe acima de toda altura, desce mais que toda profundidade, reúna em ti as sensações de todo o criado, do fogo e da água, do seco e do úmido, imaginando que estás ao mesmo tempo na terra, no mar, no céu e que ainda não nasceste e que estás no ventre materno, que és adolescente, ancião, que estás morto e que estás além da morte. Se alcanças com o pensamento essas coisas ao mesmo tempo: tempo, lugar, substância, qualidade, quantidade, podes compreender Deus.

21 Mas se mantens tua alma aprisionada no corpo, se a abaixas e dizes: "Eu não concebo nada, eu não posso, tenho medo do mar, não posso subir ao céu; não sei o que sou, não sei o que serei" que queres com Deus? Pois não podes alcançar com o pensamento nenhuma das coisas belas e boas, tanto amas teu corpo e és malvado. O vício supremo, indubitavelmente, é não conhecer o divino. Contrariamente, ser capaz de conhecer, e ter tido a vontade e a firme esperança, é a via direta que conduz ao Bem e uma via fácil. Durante tua marcha, ele virá em toda parte e teu encontro, em todo lugar se oferecerá à tua vista, mesmo no lugar e na hora em que não o esperas, estejas em vigília ou em repouso, navegues ou caminhes, de noite ou de dia, falando ou calando-te: pois nada existe que ele não seja.

22 Dirás agora: "Deus é invisível?" Não fala assim, o que é mais manifesto que Deus? Ele criou tudo para que o vejas através de todos os seres. Eis o bem de Deus, o poder miraculoso de Deus de se manifestar através de todos os seres. Pois nada há de invisível mesmo entre os incorpóreos. O intelecto se torna visível no ato de pensar, Deus no ato de criar.



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4 de fevereiro de 2012

Corpus Hermeticum - Sobre o Intelecto Comum (De Hermes a Tat)




1 - O intelecto, ó Tat, é tirado da própria substância de Deus, quanto a saber de que natureza é a essência, Deus é o único a conhecê-la exatamente. O intelecto, então, não é tirado da substancialidade de Deus mas advém a partir desta fonte, como a luz advém a partir do Sol. Nos homens este, intelecto é Deus: também alguns entre os homens são deuses e sua humanidade é muito próxima da divindade e com efeito o Bom Gênio (Agatodemon) nomeou os deuses como "homens imortais" e os homens "deuses mortais"; nos animais sem razão o intelecto é o instinto natural.


2 Onde há alma existe intelecto da mesma forma que onde há vida, há também alma. Mas nos animais irracionais, a alma é simplesmente vida pura, sem intelecto. Pois o intelecto presta seus benefícios somente às almas dos seres humanos: os faz em vista do bem. Nos animais sem razão, coopera com o instinto natural presente em cada um deles, enquanto na alma dos humanos age de encontro ao bem. Pois toda alma assim que entra num corpo é pervertida rapidamente pela pena e pelo prazer: pois a pena e o prazer são como os humores do corpo composto e que borbulham dentro de si e nos quais a alma afunda se macula.


3 Quando as almas se deixam comandar pelo intelecto, este faz aparecer a sua luz e se opõe às suas prevenções. Da mesma forma que um bom médico faz sofrer o corpo que encontra atingido pela moléstia queimando ou cortando a parte doente, também o intelecto faz sofrer a alma retirando-a do prazer, que é o princípio de onde deriva toda moléstia da alma. Ora a grande moléstia da alma é a negação de Deus, depois a opinião errônea de onde decorrem todos os males mas nada de bom. Assim o intelecto lutando contra esta moléstia confere o bem à alma como o médico dá ao corpo a saúde.

4 Por outro lado, quando as almas humanas não obtêm o intelecto por guia, sofrem a mesma condição que as almas dos seres sem razão. O intelecto coopera com elas, deixa livre curso às concupiscências, e as almas deixam-se levar pela violência de seus apetites para essas concupiscências que tendem ao irracional, e, como os animais sem razão, não deixam de se abandonar aos movimentos irracionais da cólera e da concupiscência e jamais encontram saciedade nos seus vícios: pois os movimentos irracionais da cólera e da concupiscência são os vícios maiores. E é a essas almas que Deus impôs o governo da lei para puni-las e convencê-las do pecado.


5 - Então, ó pai, a doutrina da fatalidade, que me expusestes recentemente, corre o risco de ser invertida. Pois se foi fixado absolutamente pelo destino que um tal ou qual seja adúltero ou sacrílego, ou cometa qualquer outro crime, será castigado ainda que tenha cometido o ato estritamente sob coerção da fatalidade? - Tudo é obra da fatalidade meu filho, e sem ela, nada pode acontecer no que se refere às coisas do corpo, nada de bom nem de mau. É a fatalidade que decretou também, que aquele que fez o bem sofra as conseqüências e por esta razão, agiu com o objetivo de provar, o que ele prova é porque agiu.


6 Mas eis o suficiente e até demasiado para o momento; este não é o instante de discorrer sobre o vício e a fatalidade. Nós falamos dele noutro momento, agora é sobre o intelecto que discorremos: qual é a potência do intelecto, quais diferenças que contém em si, nos humanos de uma forma, nos animais irracionais de outra forma, e de novo, que, se nos outros viventes não produz seus bons efeitos, mas é dissemelhante em todos segundo seja irascível ou concupiscente (e entre esses viventes é preciso tomar uns por humanos em possessão do verbo e outros por humanos privados do verbo), todos os humanos por outro lado são submetidos à fatalidade, ao nascimento e à mudança: eis o princípio e o fim da fatalidade.


7 Todos os humanos, portanto, sofrem as coisas fixadas pelo destino, mas os humanos em possessão do verbo, dos quais dizemos que neles o intelecto comanda, não as sofrem da mesma maneira que os outros: como são livres do mal, não é enquanto malvados que sofrem seu destino.
- Que queres dizer com isto, ó pai? O adúltero não é mau, o assassino não é mau, e da mesma forma todos os outros? - O ser humano em possessão do verbo, meu filho, não sofrerá por ter cometido adultério, mas sofrerá como se o tivesse cometido; não é por ter matado, mas como se tivesse matado. Pois, se não é possível escapar à condição da transformação, menos ainda à do nascimento; ao vício, contrariamente, quem possui o intelecto, pode se furtar. 


8 É porque, meu filho, sempre ouvi o Bom Gênio dizer - e se ele o tivesse escrito e publicado, teria prestado um grande serviço ao gênero humano; pois somente ele, meu filho, enquanto Deus primogênito, contemplou verdadeiramente todo o conjunto dos seres e por esta razão proferiu palavras divinas: eu o ouvi dizer um dia que "tudo é um, e sobretudo os seres inteligíveis; que nós vivemos pela potência, pela energia e pelo Aíòn e que o intelecto deste, que é também seu eu, é bom. Nessas condições; não possui dimensão entre os inteligíveis; conseqüentemente então, se manda nas coisas e é o eu de Deus, o intelecto possui a potência de fazer tudo o que quer:


9 reflete e aplica esta doutrina à questão que me havias proposto, isto é, sobre a fatalidade e o intelecto.
Se afastas todos os argumentos capciosos encontrarás, meu filho, o intelecto dominando as coisas, isto é, o eu de Deus, sobre a fatalidade, sobre a lei, e todo o resto; e que nada lhe é impossível, nem mesmo o estabelecimento da alma humana acima da fatalidade, nem, se esta é negligente o submetê-la ao julgo da fatalidade. Eis bem relatadas as proposições do Bom Gênio. - Estas são palavras divinas, verdadeiras e úteis, ó pai.


10 Mas esclarece-me ainda sobre este ponto. Disseste que nos animais irracionais, o intelecto age à maneira do instinto, pois coopera com seus impulsos. Ora os impulsos dos animais irracionais são, pelo menos o suponho, paixões. Se o intelecto coopera com os impulsos e se esses impulsos são paixões, o intelecto também é uma paixão pois tem contato com as paixões?
- Bem exposto, meu filho. Eis uma excelente questão e é justo que eu a responda.


11 Todos os incorpóreos alojados em um corpo são passíveis, meu filho, e a bem dizer, são paixões. Efetivamente todo motor é incorpóreo, todo móvel é corpo; ora os incorpóreos também estão em movimento, movidos pelo intelecto e o movimento é uma paixão; de modo que um e outro são sujeitos, o motor e o móvel, pois um comanda, o outro, por ser comandado. Mas quando o intelecto é separado do corpo, separa-se também da paixão. Talvez seja melhor dizer que nada é impassível, mas que o inverso é que se verifica. A paixão difere do passível. Com efeito, uma é ativa, e outra passiva. Ora os corpos também são ativos por si mesmo. Ou são imóveis ou movidos. Num caso ou no outro existe a paixão. Quanto aos incorpóreos, sempre sofrem a ação e por isso são passíveis. Não te enganes com essas designações: ação e paixão, tudo é um. Mas não existe mal algum em se servir do termo mais favorável.


12 - Explicastes da maneira mais clara, ó pai. - Considera ainda isto, meu filho, Deus gratificou o ser humano, único entre os animais mortais, com esses dois dons: o intelecto e o verbo, que têm o mesmo valor que a imortalidade (O ser humano possui também o verbo proferido). Ora se o ser humano emprega esses dons para os fins que convém, não diferirá em nada dos imortais; uma vez liberto do corpo, será guiado por um e pelo outro para o coro dos deuses e dos bem-aventurados.


13 Os outros animais, ó pai, não se utilizam da palavra? - Não, criança, possuem apenas a voz. Ora, a palavra difere absolutamente da voz. A palavra é comum à todos os humanos, ao passo que cada espécie de animal tem sua própria voz. - Mas entre os humanos também, ó pai, a palavra não difere segundo cada raça? - Difere indubitavelmente, meu filho, mas a humanidade é apenas uma: desta forma a palavra também é uma, traduz-se de língua, e descobre-se que é a mesma no Egito, na Pérsia bem como na Grécia.
Parece-me que desconheces toda a virtude e grandeza do verbo. O Bom Gênio, deus bem-aventurado, disse: "A alma está no corpo, o intelecto na alma, o verbo no intelecto, Deus é portanto o pai de todos."


14 O verbo é portanto a imagem e o intelecto de Deus (o corpo é a imagem da idéia, a idéia e imagem da alma). O que há de mais sutil na matéria é o ar, no ar a alma, na alma o intelecto, no intelecto-Deus. Deus envolve e penetra tudo, o intelecto envolve a alma, a alma envolve o ar, o ar envolve a matéria.
A necessidade, a providência e a natureza são os instrumentos da ordem e do belo ordenamento da matéria. Entre os inteligíveis, cada um é uma essência, a sua essência é a identidade; contrariamente, entre os corpos do Todo, cada um deles é pluraridade: de fato, como os corpos compostos possuem sua identidade na transformação de um em outro, conservam indestrutível a identidade: 


15 Do outro ponto de vista, em todos os corpos compostos em geral, existe um número próprio a cada um deles. Pois, sem número, é impossível a produção de combinação; composição e dissolução: essas são as unidades que engendram o número, que o aumentam e que de novo, quando se dissolve, o recebem nelas mesmas, embora a matéria permaneça única. Ora este mundo inteiro, esse grande deus, imagem do maior deus, unido a ele e conservando com ele a ordem e a vontade do Pai, é a totalidade da vida: não há nada nele através de toda eterna duração do giro cíclico desejado pelo Pai, nem em sua universidade nem em suas partes, que não esteja viva. Nunca existiram coisas mortas, não existem, nem virão a existir no mundo. É vivo que o Pai quis fosse, o mundo, tanto tempo faz que guarda a coesão: logo, o mundo é necessariamente deus.


16 Como poderia então, meu filho, nesse que é deus, nesse que é a imagem de Todo, nesse que é o pleroma da vida, existir coisa morta? Pois a morte é corrupção e a corrupção é destruição. Como supor que se corrompe uma parte desse que é incorruptível ou que seja destruída qualquer coisa de Deus?
- Os viventes que estão no mundo não morrem, meu pai, ainda que sejam partes do mundo? - Cala-te, minha criança, pois te deixas induzir em erro pela denominação do fenômeno. Pois os viventes não morrem, meu filho, mas, sendo corpos compostos se dissolvem: ora esta dissolução não é morte, mas dissolução de uma mistura. E se eles se dissolvem, não é para serem destruídos, mas para serem renovados. Qual é com efeito a energia da vida? Não é o movimento? O que existe no mundo que seja imóvel meu filho? Nada, meu filho.


17 - Mas a terra não te parece imóvel, ó pai? - Não, filho; contrariamente, de todos os seres, ela é a única sujeita a uma série de movimentos e ao mesmo tempo estável. Como não seria ridículo supor imóvel a esta nutriz de todos os seres, aquela que faz nascer e gera as coisas? Sem movimento é impossível àquele que faz nascer, fazer nascer seja lá o que for. É realmente ridículo perguntar, como fazes, se a quarta parte do mundo pode ser inerte, pois ser imóvel para um corpo não abriga outro sentido que ser inerte.


18 Saiba então, criança, que tudo o que está no mundo, tudo sem exceção, está em movimento, seja por diminuir, seja por creseer. Ora o que está em movimento também está em vida, mas não há necessidade que todo ser vivente conserve sua identidade. Pois sem dúvida, considerado na totalidade de seu conjunto o mundo é imutável, minha criança, mas as partes desse mundo são todas mutáveis, sem que nada por isso pereça ou seja destruído: são esses termos apenas que turbam os nossos espíritos. Pois não é o fato de nascer que é a vida, mas a consciência, e a transformação não é a morte, mas esquecimento. Se é desta forma, então todos esses elementos são imortais, a matéria, a vida, o sopro, o intelecto, de que se compõe cada vivente.


19 Todo vivente é portanto imortal pelo intelecto. Mas o mais imortal de todos é o ser humano, pois é capaz de receber Deus e de entrar em união com Deus. É com este único vivente que Deus se comunica, durante a noite em meio aos sonhos, durante o dia através de presságios, e lhe prediz o futuro por toda uma variedade de meios, pelos pássaros, pelas entranhas das vítimas, pela inspiração, pelo carvalho. De modo que o ser humano também se esforça em conhecer o passado, o presente e o futuro.


20 E veja isto, ainda, criança, que cada um dos animais freqüenta apenas uma parte do universo, os animais aquáticos, a água; os animais terrestres, a terra; os voláteis, o ar; o ser humano contrariamente tem relação com todas as partes igualmente, a terra, a água, o ar, o fogo e mesmo o céu, ele o vê e entra em contato com o mesmo através da sensação. Deus envolve a tudo e penetra em tudo porque é energia e potência. E não existe nada de difícil em conceber Deus, meu filho.


21 E se queres contemplá-lo, vê o belo arranjo do mundo e a bela ordem desse arranjo. Vê a necessidade de tudo o que se oferece à nossa vista e a providência que regula as coisas do passado e as que se produzem hoje. Vê como a matéria é plena de vida. Vê esse deus imenso em movimento com todos os seres que contém, bons e belos, os deuses, os daimons, os humanos. - Mas tudo isto, ó pai, é energia. - Admitamos que existam apenas energias, criança, por quem estas energias são colocadas em ato? Por um outro deus? Não vês que como são partes do mundo o céu, a água, a terra e o ar, da mesma forma são membros de Deus a vida, a imortalidade, a necessidade, a providência, a natureza, a alma, e o intelecto, e que é a permanência de todas essas coisas que se chama Bem? E que não existe absolutamente nada, nem nas coisas atuais, nem passadas, onde Deus não esteja presente?


22 - Deus é na matéria, ó pai? - Supõe meu filho que a matéria exista separada de Deus, que lugar vais destinar-lhe, ó meu filho? E que acreditas que ela seja além de uma massa confusa, enquanto não é utilizada? E se é utilizada, por quem o é? Pois as energias que operam, nós o dissemos, são partes de Deus. Por quem então são vivificados todos os seres viventes? Por quem são imortalizados os seres imortais? Quem produz as mudanças nos seres mutáveis? Quando falas da matéria, ou do corpo, ou da substância, sabes que essas são energias de Deus, energia da matéria, a materialidade; energia dos corpos, a corporalidade; energia da substância, a substancialidade; e Deus é isto, o Todo. 

23 No Todo nada há que Deus não seja. Logo nenhum destes predicados pode ser atribuído a Deus: grandeza, lugar, qualidade, forma, tempo; pois Deus é tudo; e o Todo penetra as coisas e as envolve. Adora esse Verbo e presta-lhe culto. E só existe um modo de cultuar a Deus: não ser mau.


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Corpus Hermeticum - Discurso secreto sobre a Montanha, relativo à Regeneração e a Regra do Silêncio


1 - Nas Lições Gerais, ó pai, falastes apenas através de enigmas e sem encher de luz a minha compreensão quando trataste da atividade divina, não me deste a desvelação, sob o pretexto de que ninguém poderia ser salvo antes da regeneração. Mas como eu to suplicasse durante a descida da montanha, após tua conversação comigo, como eu to interrogasse acerca da doutrina da regeneração a fim de apreendê-la, visto que é o único ponto da doutrina que ignoro, prometeste-me transmiti-la "quando eu estivesse próximo a tornar-me estranho ao mundo". Eis-me pronto, fortifiquei meu espírito contra a ilusão do mundo. Suprime então, ó pai, as minhas faltas transmitindo-me, como prometeste, o processo da regeneração, fazendo-o conhecido de viva voz ou por meio secreto. Eu ignoro, ó Trismegistos, de qual matriz nasceu o Homem, e de qual semente.


2 - Meu filho, é a Sabedoria inteligente no Silêncio e a semente o verdadeiro Bem. - Mas quem semeia, ó pai? pois estou completamente perplexo. - É a Vontade de Deus, meu filho. - E de que forma é o engendrado, ó pai? pois não pode participar em nada da minha substância. - O engendrado será diferente, será deus filho de Deus, O Todo no Todo, composto de todas as Potências. - Propões-me um enigma, pai, e não falas como um pai a seu filho. - Este tipo de coisa não se ensina, meu filho, mas, quando quer, Deus proporciona-lhe a reminiscência.


3 - Tu me dás, ó pai, explicações impossíveis e forçadas, é esta a razão pela qual farei uma justa réplica: "Nasci como um filho estrangeiro à raça de meu pai." Não me recuse ciumentamente tua ciência, pai, sou teu filho legítimo: expõe-me completamente o modo de regeneração. - Que direi, meu filho? nada mais posso dizer que isto: em mim mesmo uma visão imaterial, produzida pela misericórdia de Deus, sai de mim mesmo para entrar em um corpo imortal e não sou mais agora do que era mas fui engendrado no Intelecto. Esta coisa não pode ser ensinada e não pode ser vista com este elemento formado de matéria, formado para que através do mesmo possa se ver aqui embaixo. Eis também por que não me preocupo desta primeira forma composta que foi a minha. Não percebo mais as cores, nem o sentido do tato, nem medida no espaço, tudo isto me é estranho. Agora me vês, meu filho, com os olhos, mas o que sou não podes compreender olhando-me com os olhos do corpo e pela visão sensível, não são com estes olhos que posso ser visto agora, meu filho.


4 - Atiraste-me numa loucura furiosa e num aturdimento espiritual, ó pai: pois não me vejo neste momento. - Apraz aos céus, criança, que tu também, saias de ti mesmo, como acontece àqueles que sonham mas, no teu caso, sem dormir. - Diga-me isto ainda: quem é o operador na obra da regeneração? - O filho de Deus - um ser humano como os outros - pelo querer de Deus.


5 - Agora, com um golpe seguro, atiraste-me num estupor que me tira a palavra. Tendo perdido meus espíritos - pois te vejo sempre com a mesma estatura, ó pai, com a mesma forma exterior. - E é nisto que te enganas, pois a forma mortal muda diariamente, evolui com o tempo por crescer ou diminuir, como coisa mentirosa.


6 - Que existe então que seja verdadeiro, ó Trismegistos? - O impoluto, o que não possui limite, nem cor, nem forma, o que é imutável, nu, brilhante, o que não pode ser apreendido por outra coisa que si mesmo, o Bem inalterável, o Incorpóreo. - Eis-me realmente louco, pai, pensei que me tivesses tornado sábio, e eis que se obstruiu a percepção que tinha de meu pensamento. - E isto está certo meu filho, o que se coloca no alto como o fogo; embaixo, como a terra; o que é líquido como a água, isso que sopra pelo universo todo como o ar. . . mas como poderias perceber por meio dos sentidos, o que não é rígido, nem líquido, o que não pode ser fechado, nem inserido, e que não é apreendido a não ser pelos efeitos de sua potência e de sua energia, isto que exige alguém capaz de conceber o nascimento de Deus?


7 E disto sou incapaz, ó pai? - Que não seja assim, meu filho. Toma-o a ti e ele virá; quere-o e se produzirá; detém a atividade dos sentidos corporais e então se produzirá o nascimento da divindade; purifica-te das punições irracionais da matéria. - Possuo então manchas em mim, ó pai? - E não em pequeno número, criança, mas terríveis e numerosas. - Eu as desconheço, ó pai.
- Esta ignorância, minha criança, é a primeira das punições; a segunda é a tristeza; a terceira é a incontinência; a quarta, a concupiscência; a quinta, a injustiça; a sexta, a cupidez; a sétima, o engano; a oitava, a inveja; a nona, a fraude; a décima, a cólera; a décima primeira, a precipitação; a décima segunda, a maldade. Estas punições são doze em número; mas sob elas, outras mais numerosas, por intermédio do corpo, forçam o ser humano interior a sofrer por meio dos sentidos. Contrariamente se afastam do ser humano do qual Deus teve misericórdia, não se afastam maciçamente, é verdade, mas nisto é que consiste a regeneração.


8 Agora, não fala mais, meu filho, e guarda um religioso silêncio: como recompensa a misericórdia não deixará de descer de Deus sobre nós. Rejubila-te agora, meu filho, eis que te purificam profundamente as potências de Deus pela conjunção dos membros do Verbo. Veio até nós o conhecimento de Deus - e pela sua vinda a ignorância foi caçada.
Veio até nós o conhecimento da alegria: pela sua chegada a tristeza fugirá para aqueles que tem lugar para recebê-la. 

9 Oh! potência deliciosa! façamos-Ihe, meu filho, a acolhida mais amável: vê como pela sua chegada expulsou a incontinência. Em quarto lugar, agora, eu chamo o endurecimento, esta potência que se opõe à concupiscência. Os degraus que vês, meu filho, são a sede da justiça: vê que, sem processo caçou a injustiça. Tornamo-nos justos, criança, agora que não mais temos injustiça. Chamo a nós como sexta potência e que luta contra a cupidez, a bondade que divide. É a cupidez parte. Já se apresenta a verdade e o engano parte e a verdade vem a nós. Veja como o bem atingiu a plenitude, meu filho, com a chegada da verdade. Pois a inveja se afasta bem de nós e depois da verdade, o bem chegou, acompanhado da vida e da luz, e não fomos assolados por mais nenhuma punição das trevas, mas estas é que voaram, vencidas, com um grande rumor de asas.


10 Conheces agora o modo da regeneração, meu filho. Pela vinda da Década, meu filho, a geração espiritual foi feita em nós e ela caça a Dodécada e fomos divinizados por este nascimento. Aquele que foi gratificado, segundo a misericórdia, por este nascimento segundo Deus, tendo abandonado a sensação corporal, conhece a si mesmo como sendo constituído pelas Potências divinas e se rejubila em seu coração.


11 Tornado inquebrantável por Deus, ó pai, represento-me as coisas, não pela visão dos olhos, mas pela energia espiritual que recebo das Potências. Estou no céu, na terra, na água, no ar, estou nos animais, nas plantas, no ventre, antes do ventre, depois do ventre, em todo lugar. Mas diga-me ainda, como as punições das trevas, que são doze em número, são repelidas por dez Potências? Como isso se dá, ó Trismegistos? 12 Esta rede, meu filho, fora da qual saímos, foi constituída pelo círculo zodiacal, que por sua vez é composto de doze elementos de mesma natureza e que pode tomar todas as formas para estupor dos homens. Entre essas punições existem duplas, meu filho, que estão unidas na sua ação (na verdade, a precipitação é inseparável da cólera) e é mesmo impossível distingüi-las. É natural portanto, pela justa razão, que essas punições retirem-se quando são caçadas pelas dez Potências, isto é a Década. Pois a Década é a geradora da alma. Vida e Luz estão unidas, e então nasce o número da Unidade, do Espírito. Portanto, pela razão, a Unidade contém a Década e a Década, a Unidade.


13 - Pai, vejo o Todo e me vejo no Intelecto. - Eis precisamente a regeneração, meu filho: não mais formar suas representações sob a figura do corpo tridimensional - regeneração feita graças a este discurso sobre a regeneração que escrevi somente para ti, a fim de que não divulguemos o Todo aos habitantes do pântano de papiros, mas somente àqueles que Deu escolheu.


14 - Diga-me, ó pai, esse novo corpo composto de Potências, sofrerá um dia a dissolução? - Silêncio! não digas coisas impossíveis, pois isto seria um pecado e o olho de teu intelecto seria afetado por uma sujidade. O corpo sensível da natureza está bem afastado da geração substancial, pois um é dissolúvel, o outro indissolúvel, um mortal, o outro imortal. Não sabes que nasceste deus e filho do Um, o que sou também?


15 - Pai, quero este louvor em forma de hino que escutaste cantar às Potências quando atingiste a Ogdoada. - Segundo a Ogdoada desvelada por Poimandres, eu aprovo, criança, a tua vontade de quebrar a rede, pois agora, és inteiramente puro. Poimandres, o Intelecto da Soberania, nada mais me revelou do que está escrito, sabendo que eu seria capaz de tudo compreender e ouvir o que quisesse e tudo ver, prescreveu-me fazer o que fosse belo. Também cantam, em todas coisas, as Potências que estão em mim.


16 - Pai, quero ouvir, quero conhecer tudo isto! - Silêncio então, meu filho, escuta agora a bênção bem adaptada, o hino da regeneração: manifestá-lo-ia, segundo meu pensamento, somente a ti, desta forma sem reservas, ao fim de tudo. Também este hino não é objeto de ensino, mas permanece encerrado no meio do silêncio. Então, meu filho, coloca-te em um lugar a céu aberto, e face ao vento do sul, no momento do pôr do sol, adora; e da mesma forma ao nascer do sol, voltando-to para o vento do este. Silêncio então, criança.
Hino Secreto; Discurso IV


17 "- Que toda natureza no mundo ouça o som deste hino. Abre-te terra; que se abram à minha voz os fechos da chuva: não vos agiteis mais, árvores! Eu vou cantar ao Senhor da Criação e o Todo e o Um. Abri-vos céus, ventos, detende vossos sopros, que o círculo imortal de Deus ouça meu verbo. Eu vou cantar Aquele que criou o universo, que fixou a terra e suspendeu o céu, que ordenou à água doce o sair do oceano e estender-se sobre a terra habitada e desabitada, para a subsistência a criação de todos os humanos, que ordenou ao fogo que aparecesse para qualquer uso que dele quisessem fazer os deuses e os homens. Todos juntos elogiemos àquele que plana acima de todos os céus, ao Criador de Toda a natureza. É ele que é o olho do intelecto, que receba então o elogio de minhas Potências.


18 Potências que sois em mim, cantai o Um e o Todo: cantai em uníssono com minha vontade, vós todas, Potências que sois em mim. Santo conhecimento, iluminado por ti, é graças a ti que celebro e luz inteligível - me rejubilo na alegria do intelecto. Vós todas, Potências, cantai o hino comigo. E tu também, canta por mim, continência! minha justiça, canta o Justo por mim; minha bondade liberal, canta o Todo por mim; canta, verdade, a Verdade; canta o Bem, tu, o bem; Vida e Luz, é de vós que advém a bênção e é a vós que retorna. Rendo-to graças, Pai, energia das Potências; rendo-to graças, Deus, potência de minhas energias. Teu Verbo, por mim, a ti canta; por mim, recebe o Todo em palavra, como sacrifício espiritual. 

19 Eis o que giram as potências que estão em mim: cantam o Todo, cumprem a tua vontade. Tua vontade vem de ti e a ti retorna, o Todo. Recebe de todos, o sacrifício espiritual. O Todo que está em nós, salva-o, Vida; ilumina-o, Luz, Espírito, Deus! Pois de teu Verbo, é Noús que é o pastor. O portador do espírito, Demiurgo, és tu que és Deus.

 20 Eis o que clama o ser humano que a ti pertence, através do fogo, através do ar, através da terra, através da água, através do sopro, através de tuas criaturas. Obtive de ti a bênção de Aíòn e segundo meu desejo, pela tua vontade alcancei o repouso. Vi pela tua vontade esta bênção pronunciada."

21 - Ó pai, coloquei-o também em meu mundo. - Dize "no mundo inteligível", criança. - No mundo inteligível, pai. Tenho potência, pela virtude de teu hino e de tua bênção, meu intelecto está totalmente iluminado. Mais ainda, eu quero oferecer "de profundis" um louvor a Deus. - Não o faças levianamente, ó meu filho. - O que contemplo no Intelecto, ó pai, o digo: "A ti, primeiro autor da obra da geração, eu Tat, a meu Deus, ofereço sacrifícios espirituais. Deus, Pai, Senhor, Intelecto, recebe de mim os sacrifícios espirituais que queiram. Pois, é pela tua vontade que tudo se cumpre". Ofereces, meu filho, um sacrifício agradável a Deus, Pai de todos os seres. Mas acrescenta, criança, "pelo Verbo".

22 - Agradeço-te, pai os conselhos que me destes na minha prece. - Eu me rejubilo, criança, dos bons frutos que tirastes da Verdade, uma colheita imortal. Agora que aprendeste isto de mim, promete-me o silêncio relativamente a esse poder miraculoso, não revelando a ninguém, criança, o modo de transmissão da regeneração a fim de que não sejamos contados entre os divulgadores. Eis o bastante, ambos estivemos muito ocupados: eu em falar, tui em me escutares. Agora, conheces a ti mesmo, conheceste na luz do Intelecto e a nosso Pai comum.


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Corpus Hermeticum - Sobre Deus criador


1 Como meu filho Tat, na tua ausência, quis ser instruído acerca da natureza do universo e como não me permitiu postergar esta instrução, como é natural, pois é meu filho a um neófito no conhecimento das coisas particulares, fui forçado a tratá-las mais longamente, a fim de que a doutrina lhe fosse mais fácil de seguir. Mas para ti, quis, do que foi dito, escolher a enviar sob forma de epístola os assuntos mais importantes, exprimindo-os de maneira mais secreta tendo em vista tua idade mais avançada e a ciência que adquiriste da natureza das coisas.

2 Se as coisas que aparecem aos sentidos vieram a ser e vêm a ser, e se as coisas vindas a ser, vêm a ser não por elas mesmas mas por um outro e se muitas coisas vieram a ser, ou melhor, se vêm a ser as coisas que aparecem aos sentidos e as coisas diferentes e dissemelhantes e se as coisas vindas a ser, vêm a ser por um outro, existe alguém que criou as coisas e este alguém não veio a ser, se se deseja que seja anterior às coisas vindas a ser. Pois as coisas vindas a ser, como eu o declaro, vem a ser por uma outra: ora nada pode existir antes do conjunto das coisas que vieram a ser, senão o único que não veio a ser.

3 Este é o mais possante e único, e é o único realmente sábio nas coisas, pois nada há que lhe seja anterior: pois é o Primeiro na ordem do número e na ordem da grandeza e pela diferença que existe entre ele e os seres criados pela continuidade de sua criação. Por outra parte, os seres criados são visíveis, mas ele é invisível: é justamente por isto que cria, para tornar-se visível. Cria todo o tempo: conseqüentemente é visível.

4 Eis como é necessário pensar, e logo, admirar, e isto posto, considerar-se bem-aventurado pois conheceu-se o Pai. O que há de mais doce que um verdadeiro pai? Que é ele e como conhecê-lo? É acertado atribuir-lhe, e somente, o nome de Deus, ou aquele de Criador, ou de Pai, ou ainda os três? Deus devido à sua potência, Criador pela sua atividade, Pai pelo Bem? Pois é potência, sendo diferente das coisas vindas a ser e é atividade pela qual as coisas vêm a ser.
Detendo toda vaga de palavras e os discursos vãos, é necessário apegar-se a esses dois conceitos: o que é criado e o que criou, pois entre esses dois nada existe, nem mesmo um terceiro termo.

 5 Em Tudo o que concebes, em tudo que ouves dizer, lembra-te desses dois e convence-te que tudo se resume neles, sem dúvida, nem acerca das coisas do alto, nem das coisas de baixo, nem das coisas divinas, nem das coisas mutáveis, ou das coisas das profundezas; pois tudo que existe se resume em duas coisas: o que foi criado e o que criou, impossível é separar um do outro; pois o que cria não pode ser separado do que é criado, cada um dos dois está submetido a isto e nada mais, é por esta razão que nenhum pode ser separado do outro e mais ainda de si mesmo.

6 Se o criador nada mais é que a função criadora única, simples, incomposta, esta função deve necessariamente criar a si mesma, pois o criar daquilo que é criado é produção do ser e tudo o que é produzido não pode existir como produzido por si mesmo, é produzido necessariamente por um outro, sem o criador portanto, o que vem a ser, nem vem a ser nem existe. Uma vez separado do outro, cada um desses termos perdeu sua própria natureza, privado que foi de seu complemento. Se se reconhece então que a realidade se resume em dois termos, o que foi criado e o que criou, esses dois formam uma unidade em virtude de sua unidade, um à frente o outro seguindo: o que marcha à frente é Deus criador, o que segue, e coisa criada; qualquer que seja.

7 E não te ressabies pela diversidade das coisas criadas, no medo de degradar a Deus e acarretar-lhe uma falta de glória: para ele é uma glória criar todos os seres e é isto que é conforme ao corpo de Deus, o fato de criar. Mas o criador nada possui que seja feio ou mau: pois esses são acidentes inseparavelmente ligados à geração como a oxidação ao bronze ou a banha ao corpo. Ora não foi o operador que produziu a oxidação, nem os pais que fizeram a banha, nem Deus que criou o mal. Mas é a duração das coisas criadas que produz esta forma de pestilência maléfica e eis a razão de ter feito, Deus, a transformação como uma purificação das coisas criadas.

8 Bem, se ao pintor é permitido fazer o céu e os deuses, a terra e o mar, os humanos e todos os animais e os objetos inanimados, Deus não poderia criar tudo aquilo? Que loucura, como és falto de conhecimento relativamente a Deus! Aqueles que falam desta maneira fazem a mais estranha das experiências: ao mesmo tempo que pretendem afirmar a sua piedade relativamente a Deus e dar-lhe graças, recusando atribuir-lhe a criação de todos os seres, não somente ignoram Deus, mas, além desta ignorância, cometem a mais negra das impiedades atribuindo-lhe como qualidades o desdém ou a impotência. Pois se Deus não é o criador de todos os seres, é porque ou desdenha criá-los ou não o pode; ora é ímpio pensar nisto.

9 Pois Deus possui apenas uma qualidade, o Bem, e o ser bom não é nem desdenhoso nem impotente. Sim, eis o que é Deus, o Bem, e a potência de tudo criar, e todo o criado vem a ser por Deus, isto é, por aquele que é bom e tem a potência de criar tudo.
Agora, se queres saber como Deus criou e como as coisas criadas vieram a ser, tu o podes: eis uma comparação bela e verossímil.

10 Veja o trabalhador lançando a semente à terra, aqui o frumento, ali a cevada, mais adiante alguma outra espécie de semente. Veja-o ainda plantado aqui uma parreira, ali uma macieira, e todas as outras espécies de árvores. É desta forma que Deus semeia no céu a imortalidade, na terra a mudança, no Todo a vida e o movimento. Esses princípios não são numerosos, mas em pequeno número e fáceis de contar: pois são quatro ao todo, mais o próprio Deus e a natureza criada, que constituem tudo quanto existe.


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